Skip to main content

Poucos temas unem de forma tão surpreendente filosofia, música e Roger Scruton. Neste artigo, vamos explorar como Scruton nos ajuda a entender a dimensão filosófica da música, indo muito além da simples apreciação estética.

Esse é o tema da aula 11 do curso “A Arte de Pensar Filosoficamente“, baseada na obra de Roger Scruton.

Logo de início, é importante desmistificar duas formas comuns (e equivocadas) de se relacionar com a música:

  1. Música como pano de fundo: muitas vezes colocamos música enquanto trabalhamos, estudamos ou realizamos outras tarefas. Embora isso tenha seu valor prático, não representa a verdadeira experiência estética da música.
  2. Música como escapismo: especialmente entre jovens, a música vira um mecanismo de isolamento da realidade, usado como fuga do ambiente ao redor.

Nenhuma dessas abordagens esgota o potencial filosófico e existencial da música. A verdadeira audição musical exige atenção ativa, como se estivéssemos lendo um livro complexo: mergulhados no conteúdo, absorvendo cada nuance.

O Olhar Filosófico de Roger Scruton sobre a Música

Roger Scruton dedicou uma parte significativa de sua reflexão à interseção entre música e filosofia. Diferente de muitos filósofos acadêmicos que se limitam a temas tradicionais, Scruton ousou incluir a música como um dos campos legítimos de investigação filosófica.

Segundo ele, a música tem uma natureza única:

  • O som, por si só, não é música. Música é som organizado, intencional, harmonioso.
  • Existe uma diferença essencial entre ouvir barulho e ouvir música. A música carrega intenção, ordem e estrutura, sendo fruto da liberdade e criatividade humanas.
  • A música vai além da sua materialidade (notas, timbres, partituras). Ela nos conecta a algo superior, transcendental, que escapa ao mero mundo dos objetos físicos.

Assim como em suas reflexões anteriores sobre liberdade e moralidade, Scruton insere a música dentro de sua tese geral: existem aspectos da experiência humana que só fazem sentido se admitirmos uma dimensão que transcende o material.

A Música como Experiência Estética Elevada

Scruton aponta que nem toda música oferece essa experiência elevada. Apenas as grandes obras – sinfonias de Beethoven, fugas de Bach, entre outras – têm o potencial de transportar o ouvinte para essa esfera superior de contemplação e ordem.

Nesse sentido, a música não é apenas entretenimento. Ela possui um poder formativo e educativo. Platão, por exemplo, já alertava que a música poderia moldar (ou corromper) a alma de uma sociedade, a ponto de defender sua regulamentação nas cidades.

O Perigo da Redução Cientificista da Música

A visão moderna, científica e industrializada da música, segundo Scruton, empobrece sua essência. Ao transformar música em produto de consumo ou mero estímulo neurológico, perde-se o reconhecimento de sua dimensão ética e espiritual.

A música, quando reduzida a algoritmos de venda e listas de reprodução descartáveis, deixa de ser veículo de elevação e passa a ser um simples artifício de prazer instantâneo.

Pitágoras, Ordem e a Harmonia do Universo

Como referência externa, Scruton recupera a tradição pitagórica. Pitágoras via na música uma expressão da ordem cósmica. A harmonia musical seria reflexo da harmonia do universo: um testemunho audível de que a realidade é regida por proporção, equilíbrio e sentido.

Essa visão pitagórica ressoa com o ponto central de Scruton: a música não apenas nos dá prazer sensorial, mas aponta para a própria estrutura da existência, funcionando como um vislumbre do intemporal e da liberdade.

Conclusão

A música, portanto, não deve ser vista como simples passatempo ou pano de fundo cotidiano. Ela é uma poderosa janela para aspectos profundos da existência humana: intencionalidade, liberdade, transcendência e até mesmo espiritualidade.

Como Scruton resume:

“Na experiência da música, podemos obter um relance do que poderia ser para um indivíduo existir no tempo e na eternidade.”

Por isso, ao ouvirmos música de verdade, somos convidados não apenas a escutá-la, mas a participar dela, tornando-nos coautores de uma experiência estética e filosófica transformadora.

🎧 Prefere aprender ouvindo um podcast? Este conteúdo também está disponível em no nosso podcast Oliver Talk!

Links Úteis:

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.